2009/12/13

OS BONECOS DE SANTO ALEIXO

O teatro de marionetas entrou, definitivamente, nas práticas do teatro actual. Na realidade, o fenómeno ficou a dever-se, a meu ver, a um conjunto de circunstâncias contextuais e históricas relativamente recentes (em particular pela afirmação dos Estudos Culturais) que favoreceram, não apenas a sua conservação, mas também o seu desenvolvimento criativo.
Assim, a revalorização do teatro de marionetas (que passou pela crítica da visão primitivista desse tipo de teatro), ficou igualmente a dever-se, por um lado, à abertura da vida teatral contemporânea à inovação, e, por outro, à evolução dos estudos teatrais (assente, no essencial, numa percepção pluridisciplinar das metodologias).
Contudo, é bom ter presente que o teatro de marionetas não deixou de manter uma autonomia ou, se se quiser, uma certa marginalidade relativamente ao contexto das formas e das práticas do teatro contemporâneo. Daí que se possa afirmar, com toda a propriedade, que as artes visuais ou ditas performativas integraram no seu seio - e de forma irreversível – o teatro de marionetas.

O processo de revitalização dos Bonecos de Santo Aleixo, por exemplo, iniciado em 1978, tornou-se visível em vários domínios e, hoje, no plano do espectáculo, a sobrevivência da tradição não coloca grandes problemas.É que o sentido de pertença dos Bonecos possui, na hora actual, um valor patrimonial inquestionável.
Aliás, um breve um olhar pela geografia dos espectáculos demonstra que os públicos são cada vez mais complexos e heterogéneos (já não se restringem às populações rurais de Aldeia de Pias, de Santo Aleixo da Restauração ou de Foros da Fonte Seca, mas abrangem cada vez mais camadas elististas e urbanas de Lisboa, de Barcelona, de Amestardão…).
Ora, esta pulverização de públicos acarreta a multiplicidade de discursos, os quais não se podem limitar, doravante, à rigidez local (e museológica), mas que devem reequacionar o presente a partir da sua matriz ancestral (inscrita no passado histórico e nas tradições locais).
Por conseguinte, será a sua plasticidade discursiva e a sua adaptabilidade aos contextos globais que ditarão a função e a influência que os Bonecos de Santo Aleixo – e, de resto, todo o teatro do género – terão no teatro pós-dramático. Quer dizer, a afirmação plena da marioneta no teatro e na cultura contemporânea prender-se-á, no fundo, com o modo como estes objectos se relacionarão com o espectador universal.
Em suma, o boneco, embora fortemente conotado com o seu valor estético, identitário e memorialista, deve centrar-se, também - e sobretudo - na promoção da sua funcionalidade discursiva, i. e., na sua dimensão artística. Porque é pela arte – teatral – que ele afirmará a sua existência entre os homens. De pleno direito. Et pour cause...
© Manuel Fontão

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