2009/12/19

ANTÍGONA

A intriga inicia-se com a morte dos dois filhos de Édipo (Etéocles e Polinices), que se gladiam até à morte pelo ceptro de Tebas. Em resultado destas lutas intestinas, Creonte, parente próximo da linhagem de Jocasta, sobe ao poder e, desde logo, publica um édito em que prescrevia as regras funerárias dos irmãos Labdácidas. Assim, o documento estipulava que o corpo de Etéocles receberia todo o cerimonial devido aos mortos e aos deuses, ao passo que o corpo de Polinices seria largado a esmo, sem direito a sepultura e, como tal, deixado ao abandono para que as aves de rapina e os cães o dilacerassem. Claro que o objectivo de Creonte encerrava, de per si, um valor de exemplo e de intimidação: todos aqueles que pretendessem intentar contra o governo de Tebas deveriam lembrar-se do sucedido… Ora, ao saber do édito, Antígona deixa claro que não permitirá que o corpo do irmão fique sem receber os ritos sagrados, nem que, para isso, tenha de pagar com a própria vida. Importaria, pois, na sua perspectiva, evitar a ignomínia... Nem de propósito. Ainda no primeiro episódio, Creonte é informado, por um guarda, de que o corpo de Polinices havia recebido uma camada de pó – o que significava, pois, que o seu édito havia sido desrespeitado e, em consequência disso, que a sua própria autoridade havia sido posta em causa. De resto, Creonte fica ainda mais enfurecido quando o próprio coro levanta a questão se não teria sido obra dos deuses… No segundo episódio, o guarda descobre que o rebelde era justamente Antígona. De pronto, Creonte ordena que seja chamada à sua presença e a cena constitui uma oportunidade singular para se assistir a um duelo eminentemente ideológico: de um lado, a suposta ré, que assenta a sua defesa no escrupuloso cumprimento das leis e na vontade dos deuses (as quais, segundo ela, são mais antigas e, de resto, superiores aos princípios emanados pelo homem); e, de outro lado, o inquisidor, que tenta mostrar que ela agiu errado (explicando os seus motivos e as suas razões). Assim é. Os campos estão extremados. Nem um nem outro cedem às suas crenças. a tragédia está iminente... Ora, é neste preciso momento que Creonte manda chamar Isménia, que, mesmo sem ter concordado com o acto da irmã (cf. prólogo), confessa todavia um crime que não cometeu. Em resultado de tudo isto é ditada a sentença, cruel e impiedosa: são ambas condenadas à morte. Como se previa... O segundo estásimo, esse, constitui uma reflexão sobre as maldições que se acumularam sobre os Labdácidas e o diálogo travado entre Creonte e seu filho Hémon (futuro marido de Antígona), já no terceiro episódio, é disso exemplo: com efeito, o jovem rapaz, não obstante dar mostras de elevada honradez e de submissão às ordens paternas, não enjeita a oportunidade de lançar um conjunto de argumentos concretos em defesa da sua amada (Antígona) e explicita o facto de o édito estar a ser objecto de forte contestação por parte do povo e, mais do que isso, afirma, sem tibiezas, que a cidade está de acordo com o feito de Antígona. Mas Creonte não se dá por vencido e a discussão conhecerá o seu clímax, quando Hémon, face à inflexibilidade do pai, ameaça pôr termo à sua própria vida, caso o édito não seja revogado... Entendido como um acto parricida, o tirano decide, então, tornar mais cruel ainda a pena de Antígona, encarcerando-a numa caverna cavada na rocha, e restringindo-lhe a alimentação, para que ela tenha uma morte lenta... No terceiro estásimo, assiste-se à celebração de Eros, deus do amor, que, geralmente, leva as pessoas a ignorarem o bom senso e no quarto episódio são visíveis as lamentações de Antígona. Certo. Toda estas cena se pode entender como uma tentativa de insuflar, no povo, o espírito de revolta (contra a tirania de Creonte), mas também é legítimo interpretá-la como uma auto-comiseração... No quarto estásimo, o coro faz comparações com outros personagens mitológicas (que também haviam sido emparedados) e no quinto episódio entra Tirésias (um adivinho conhecido e respeitado por todos), que adverte Creonte do mal que se irá abater sobre si, devido à sua teimosia. Aliás, o adivinho faz-lhe notar que a sua conduta está a atrair inexoravelmente a fúria dos deuses. Mas nada consegue demover o tirano. Creonte continua irredutível na sua posição, mas, em boa verdade, por pouco tempo: após a partida do sibilino, o coro convence-o, finalmente, a libertar Antígona e a sepultar Polinices… Demasiado tarde, todavia. Quando Creonte vai buscar Antígona, encontra apenas o seu corpo defunto, pois que se havia suicidado. Mas a tragédia não se fica por aqui. Hémon, ao saber da morte da sua amada também pôs cobro à sua existência e Eurídice, a esposa do tirano, também não escapa a um fim trágico: com o desgosto da morte do seu querido filho (Hémon), também acabaria por se suicidar… Resta, por conseguinte ao coro, no quinto estásimo, recorrer a Dionisio, patrono de Tebas, para que ele restaure a ordem e a paz na cidade…


© Manuel Fontão

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