2010/08/20

DESIGN DO PRODUTO_3.CONCLUSÃO

We buy things. We like to exchange things. We steal things. We donate things. We live through things. We call these things goods. We don’t call them bads.
James Twitchell

Neste início de século, assiste-se, a meu ver, a duas grandes abordagens do design, isto é, duas visões emergentes, que se afrontam e se anulam: a primeira, prender-se-á com uma forma de design dirigido às grandes massas populacionais e, como tal, considerado como um mero instrumento tecnológico e uma estratégia de marketing. Nesta óptica, acrescente-se, o design é interpretado como algo de redutor, pois que se assume como um papel instrumental, quiçá uma disciplina coadjuvante ao serviço da indústria, que, como sabemos, pretende, antes de mais, produzir objectos em série, cada vez mais funcionais, ao menor custo de mercado e, de resto, emprestar um aspecto apelativo para convidar o consumidor final à comprar. Mas voltemos, agora, à segunda concepção do nosso objecto de estudo, aquela que vislumbra o design como uma arte, imbuída, aqui e ali, de uma função eminentemente poética. Ora, nesta perspectiva, o design assemelhar-se-á a uma missão, a uma produção de autor, criativa e até mesmo mística, na medida em que o génio engendra a obra de arte segundo uma filosofia de vida muito própria capaz de influenciar, ulteriormente, o espírito lógico do tecido empresarial.

Assim perspectivado, o objecto parece não significar, quer dizer, parece não emprestar uma forma a um conteúdo mais ou menos aleatório e imotivado, levado a cabo por um sector industrial determinado, mas, antes pelo contrário, parece constituir, antes de mais, uma maneira de conceber a vida, i. e., uma forma de perceber o objecto em causa, que encerra, na sua concepção e na sua manifestação, a cosmovisão do seu autor – o designer. Destarte, o objecto, é, antes de mais, um objeu (entrecruzamento do eu e do objecto).

Dir-me-ão, por conseguinte, que o design marcadamente genuíno é aquele que se dirige a um certo segmento do público. Mas o facto não elimina o paradoxo. Porque paradoxo existe, mesmo no centro da cultura contemporânea, pois que o homem coetâneo deseja, por um lado, que o mundo seja uniforme, que os princípios directores se mantenham nivelados na sua arquitectura geral (cf. o euro, o cartão de crédito, o Europass, os padrões gastronómicos, os canais televisivos, etc. ), mas, por outro lado, o mesmo homem anseia, ao mesmo tempo, que o mundo, o mesmíssimo mundo, guarde intacto o sentido da diferença, a premissa da unicidade e da singularidade que distingue, em última análise, cada cultura nacional. Em suma, o homem, o mesmo, quer, por um lado, anular as barreiras físicas e culturais entre os Estados, mas, por outro, teme perder as suas linguagens específicas, as suas subculturas, a sua identidade cultural, o seu sentido da Nação.

Em guisa de resumo, parece-me que a questão é bem mais complexa e mereceria uma reflexão mais aprofundada. Até porque quando Starck apresentou a sua cadeira Miss Trip, referiu que a mesma constituía um arquétipo da cadeira de cozinha sobre a qual a sua mãe servia o café com leite. Será então legítimo afirmar que quando adquirimos, por exemplo, uma cadeira, não compramos a cadeira, mas o odor de café que guardamos na memória, porventura para recuperar – ou evocar – um momento de afecto perdido nas trevas do tempo? Ah! Sim! Falar do objecto não me parece nada interessante. O que me parece verdadeiramente interessante, isso sim, é falar da memória que o objecto evoca – que o diga Marcel Proust .
© Manuel Fontão

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